Publicado em 26/10/2009Editorial do jornal Estado de Minas - 26/10/2009
Corre risco o agronegócio brasileiro. Quando parecia /superada a ameaça da esdrúxula obrigatoriedade de toda propriedade rural ter sua produtividade dobrada em 2010, uma nova pressão é articulada em Brasília. Movidos pelo anacronismo das economias planejadas do século passado, em que o governo arbitrava até os volumes de produção - por isso mesmo as levou à falência -, os defensores dessa irracionalidade não desistem. Agora, pretendem usar até a caneta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva contra o produtor rural.
É conhecido o verdadeiro pavor que o Palácio do Planalto tem pela abertura e, pior ainda, pelo avanço de qualquer forma de investigação parlamentar sobre possíveis desvios da administração, em véspera de eleição. O que ocorre com a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Petrobras, sufocada pelo rolo compressor do governo, acabou inspirando os que pretendem forçar a entrada em vigor da tal produtividade obrigatória. Sonham em tomar para a reforma agrária bons pedaços de terra de quem não se virar para produzir não o que pede o mercado, mas o que manda a lei.
Querem envolver o presidente na chantagem de baixar o decreto da produtividade como forma de contra-ataque, de intimidação aos ruralistas que apoiam a CPI do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Essa investigação parlamentar só foi possível graças às imagens de vandalismo protagonizadas por tratores destruindo pés de laranja numa propriedade invadida por membros do MST, em São Paulo. Controlador de confortável maioria no Congresso, a qual mantém pela via de liberação de emendas do orçamento e nomeações para os milhares de cargos que manipula na máquina pública, o governo certamente não precisa do tal decreto. Bastará um breve sinal a seus liderados para impedir que a CPI abra arquivos a respeito de cerca de R$ 160 milhões de verbas federais que, segundo a ONG Contas Abertas, foram parar nas mãos do MST desde 2002. Tão desnecessário quanto desprovido de bom senso, decretar a revisão da produtividade rural com o propósito de atingir membros de uma CPI será ato à altura de quem tramou o golpe, mas certamente muito abaixo de um estadista de inédita aprovação popular.
Diferentemente de pôr mais lenha na fogueira e aumentar a temperatura do confronto entre o agronegócio e certas áreas do governo, o que se espera do presidente Lula é que ele acrescente mais luz e menos calor ao debate. A questão agrária, assim como os embates no campo ambiental, precisa ganhar logo a importância e a profundidade que realmente tem. O Brasil não será democracia madura nem economia competitiva se não aprender a lidar com questões dessa magnitude sem trocar a postura acadêmico-juvenil pela visão adulta e pragmática do mundo moderno. A ideia distorcida e preconceituosa do agronegócio, mantida por certos setores contaminados pelo viés retrógrado do controle da vida pelo Estado, só faz afastar o Brasil das economias mais desenvolvidas do mundo. E é com elas que teremos de negociar o lugar que merecemos. Resta esperar que a prioridade eleitoral não tenha ainda afetado o bom senso de Lula e que ele faça prevalecer a racionalidade.